06/12/2009

Capoga/Muquem III

III
Sol dourado no sertão amarelado, pé de siriguela, bigu na feira do brejo,roda de ciranda nas noites de calor de marré deci...e o muquem na rural arrastando os pés na rodagem.Meu avô, Neco Tunico, homem alto , forte, confeccionando bainha de facão, chinelo de couro, obrigado a dar passagem em suas terras pro rei do sertão o temido Lampião.Minha avó Pedrina Pedrosa, india acocorada no pé do fogão a lenha, cachimbo na boca cabelo preto escorrido, corria atrás da gente miúda, as pestinhas, como dizia ela, com um cabo de vassoura na mão. Cheiro de pimenta do reino no feijão feito no caldeirão de ferro, buchada de bode, gritos de carneiro na madrugada olhar assustado pela fresta da janela, carne doce...cacimba,
banho de cuia, cavalo a galopar pela caatinga, primos, tias, levantando poeira no forró de chão batido, capela, zabumba e brincadeira de onça sob a lua cheia no alpendre de assombração...serra do araripe, meu pai no jipe, atoleiro, sangradouro, chuva no meu chão. A minha aldeia de barro tornou-se vaso rachado em minhas mãos de tijolo inflamado com ferramentas de aço inoxidável e galerias civilizadas, conceituadas e novamente apagadas em minha vida mosaica, prosaica, real desesperadamente real, lívida inesperadamente urgente de tudo...e eu com um bebê no colo, filhos em volta,criança em roda com seu pai e avô velando e guardando seu ideal. Quarenta anos se passaram,mas o tempo não existe, tá nublado, tá ensolarado...vidas gestadas, sorrisos guardados e o dia de hoje presenteado.

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