30/08/2012

Esqueço


Esqueci um jeito de falar
esqueci  palavras de minna infância
O doce pidão olhar
vozes de fim de tarde, esmoleu
com coragem  do escuro, orgulho
Aqui quis inventar um jeito de viver sem lembrar
Quis sem jeito , ficar, vidas confiadas, gerar
Gelada, escaldada, sem vontade de voltar
Fúria abrandada, ancestrais em mim incompreendidos
Muitos risos e perigos
Vontades, bondades, quereres ,nada ensaiei
Fui plantando nas linhas tortas,sem memórias vivas, turvas ou nem mortas
quase sem molduras nem trinco nas janelas, montanhas ,cachoeiras e portas
Fui deixando o frio, as águas, as estações, paisagens ,cheiros,sons, meu barro moldar
Peneirando num jardim de redes, um moinho louco no meu olhar sem lente nem leito, feito lágrima, desaguar
O quanto nadei só eu sei
Mesmo assim vou deixar a vida , meu espírito, desalmar
E em carne viva minha calma dessossar
Para que eu não esqueça que o mundo todo é meu lugar


21/08/2012

Agora

Chão de pipoca, banho de brinquedos e demora
jardim com amora, lixo esperando lá fora
e agora o que fazer do dia invertendo as horas
num delirio de comprimidos ,compromissos ,febre ,dores ,manhas, dengos e enfim melhoras
Diagnóstico de enxaqueca,dívidas , cobranças, circo na lembrança
Voltas, trezentas voltas com o carrinho de bebê em torno da varanda, cantiga antiga de ninar desce , sobe enfim …dorme
Ninar, nanar você nas estações, usar o mouse numa orgia de idéias,coragem
criação e sabedoria a favor da nanotecnologia!
Pausa na retina , grito na espinha, silêncio da rotina sem confetes ,com  repentes, rãs  e doces de cora coralina
Tempo para os cuidados com o menino e a menina, doação de corpo, calma, alma, oração, alergias em respiração, com o coração na mão, me distraio e caio com a cabeça no chão
Leio manoel de barros nas minhas alegrias vivas de quintal, não tenho falado com minha mãe, tenho sonhado com minhas tias ,tios e casamento de primas, tenho comprado muita aspirina
Tudo isto , caetano , nem torquato sabe ou sabia a  que se destina
E eu …querendo ousar na minha existência pequenina algo que desatina

17/07/2012

Àguia

Desembarquei  de mim como do luar da sonata do sertão
Todos os lugares que passei  soavam uma diferente canção
Quando ouvi meu coração voei para dentro da águia que em sonho
me levou para um mar prateado
Eu olhando pelos olhos dela via o outro lado
Flutuantes passos, sons infinitamente sibilantes
Mistério sondando a latejante curiosidade
O coração quase saindo pela boca e a sensação
trêmula de ter vivido um segundo de extrema verdade
Feita de sonho e solidão

Acordei e nunca mais tive a coragem de sair por aí

Ouvindo a melodia sem sol  do disco negro a girar sem dó
Teci em meus ouvidos a harmonia de dias contidos em um arrebol
Com teu riso afinado em mi bemol

  Luas depois, o silêncio se fez, instalado, impregnado
Sem lago ,sem peixe ,sem anzol  sem tato para a vida ao meu redor

Meu bem, nossos filhos a lux sei
vamos viver na paz de agnus dei
E amar até que seja lei

Ponto

Já disse, não vou sair
Não quero ir a lugar algum
Já disse, não quero visitas
Não quero ver ninguém

Nem ao trabalho vou me dar o trabalho de ir
Quero hibernar, invernar... com as crianças brincar
Nada mais inventar
Inverno molhado, úmido, ilhado

Chocolatear, pipoquear e filmear, mais nada que me faça pensar
Tenho que observar, deixar a nuvem passar
Um cigarro fumar, um vinho tomar

Ou devo ... acordar, levantar, sair e sei lá
A vida tecer em finos fios e neles labutar
Já são dias passados sem sequer a rotina vigiar

Drumonzinho salve-me de minhas linhas geraizinhas ...
Eu me escondendo de minha dorzinha
Com receio das unhas arranharem as virgulazinhas
Nem sei onde encontrar a exclamação, o parênteses... a penas o final do ponto  para me guiar

30/06/2012

Lado PA

Quando criança tenho na lembrança
Dias, tardes e noites de pura alegria
Brincava de roda, ciranda, onça e dona candinha

Quando chovia, no coqueiro subia
Na palha da macaubeira, os bueiros descia
Pegava sapinhos pululantes nas mãos e escondia

Pelas calçadas corria, em cada bica parava,
a água da chuva saboreava e bebia
Não adoecia, nem tristeza sentia

No sol escaldante andava de bicicleta ao meio-dia
Não tinha sequer uma noite sem passar  anel, mascar chiclete 
Emprestar rosas cheirosas dos jardins das casas vizinhas
Para enfeitar os altares de festas, anjos de bonequinhas e magia!

Vestido novo, missa, festa de igreja, almoço de domingo no sítio vovó, tudo era fantasia!
Bonecas de papel, tamancos de madeira trazidos da capital, presentes de minhas tias!
Grupo escolar, merenda, professora que de tanto carinho, mais fada parecia!
Presentes de barro, panelinhas, jarrinhas, sofá de madeira, mesinha, bonecas de pano que da feira todo sábado mamãe trazia!

Vamos passear de carro! para o Muquem, sítio de meu avô paterno no gipe verde de papai todo mundo ia!
No alpendre iluminado pela cantiga da lua (bença mãe lua, da boa ventura, cresce meus cabelos que bata na cintura!), aboios, histórias de assombração de meu tio vaqueiro, eu morrendo de medo, no colo do meu avô, Neco Tunico, no sofá de couro (lindo!), feito caçula, adormecia!
O cachorro Joli , malhado, orgulho de padim, era assim que meu irmão tratava meu avô, pois era seu padrinho,o então Joli, era cheio de mania!

Dali, direto pra rede com mosquiteiro e embaixo uma bacia de alumínio, onde o mijo caia a meninada amanhecia!
Cinco horas da manhã, no curral o gado mugia, leite no balde, passarada em festaria!

Minha avó, dona pedrosa, cabelos negros até a cintura, miúda, braba, cachimbava no pé do gigante  fogão á  lenha, eu menina mirradinha, cabelos cacheadinhos, pichainzinho, pé descalcinho, de pijama de flanelinha
pelas frestas da janela tudo assistia!
Era o bode que berrava, o peru que grugurava, o gato miava,  galo cocoricava, cavalo relinchava e Joli soberamente no comando latia!

Meu tio Chico, minha tia Maria e suas filhas Edna e Preta, meus tios gêmeos Olivo e Olimpo, Chicô, com sua irmã doida e nua e seu irmão manco sanfoneiro, tia Dita.. a queda.do pé de ciriguela, jumentinho selado e arreado em disparada pela caatinga... eu na garupa, minha infância á galopar!

Banho de cuia no improviso do chão de terra batida
Cabelo lavado com raspa de juá
E a tardizinha a mesa posta com cominho e pimenta do reino ardida
Na medieval sala de jantar!

Menina experimentadeira e ligeira que eu era, armava arapuca para os passarinhos
Corria pela ladeira, os pés batendo na bunda em disparada, com o coração quase  na boca!!
Baladeira no pescoço, corria para o rio perto do bananal acompanhar minhas primas que lavavam
roupa quarava e batia!
Elas cantavam toadas gritadas com vozes roucas num português ancestral e diziam; esbarra aí ,eu, esperava!
Cuma é? o qui tu dixe?e longe cuspia!

Capelinha no terreiro da frente, altar cheio de santinho, onde o padre vinha batizar uma ruma de netinho!
Vinham os caretas na semana santa pedir prenda e chicotear os corajosos na malhação do judas perto da
igrejinha!
Na noite de brincadeiras um cercado de arame com o boneco judas no meio, vestido no capricho
Cachos de bananas, coco, melancia, porco e  galinhas em volta dele, eram os prêmios para quem ali se atrevia !
Gargalhadas, noite estrelada, gritos da meninada, até meia-noite o céu festejava  no Muquem e a gente toda se divertia!

Domingo a noitinha hora de ir embora...eu não queria!
Mas no outro dia para o grupo escolar eu ia!
Sexta-feira chegava , agora era a vez de ir pro sítio Grãum de vovó Socorro Maria!

Um fim de semana Grãum, no outro Muquem
E eu nesse vai e vem... não tinha pra ninguém!
Hoje bate em meu peito a saudade que me mantem !

10/06/2012

Açoite

Porque não doçura, o enlace, mas este gosto de abismo que entrelaça com sensação de esmola jogada sem vontade, sem caridade, tenha mais piedade, deixemos a agonia de lado...esse viver com dose de floral para aliviar o mal numa dor que vai e volta. Essa onda na espinha dorsal que chega ao nervo crucial ...o inatingível, o outro que de mim traz o abissal, coisas que não quero sentir nem causar...ah quem dera que a leveza fosse um botão na internet, um mural no Facebook e eu que mal sei ser contemporânea mal consigo ter uma vida em mim nem sequer abrigar das intemperes os que de mim esperam, quem sou para falar com quem sabe, não sou nada ,não sei nada nem nadar, titubear é mais certo que almejar compreensão ou... essa casca de forte, esse não medo de morte, essa tosse, esse coração torpe, sensação de que tudo carece de sorte com essa rima pobre com jeito de falso nobre! E essa vida engavetada, em prateleiras empoeiradas, paredes desbotadas, lágrimas enfileiradas ,vontades encarceradas, alma devastada, confesso não querer ser além de tudo, nada!
         O silêncio açoita meus pensamentos com palavras batendo nas pedras de minha mente explodindo os tímpanos dos transeuntes feito sirene de emergência como leite a escorrer por dentro do sono inocente, causando um desastre como numa enchente.Sei que a caminho do dia volta essa sensação de tudo a escorrer por fora como água quente, quase morna e um sem querer passar as horas na espera que tudo cheire ao  som do telhado na chuva de outrora .Vem repetidamente essas palavras como ondas batendo na praia, sacudir areias em meus ventos, tornando meus dedos rígidos, em mamulengos.
         De amar não sei nada , só um ríspido ar de quem amou quando criança e naufragou. E agora que de mim desdobram-se outros corações, choro com sofreguidão a dor de não sei o que causar quando não há intenção do mais leve ar de compaixão. Sigo ou não, acho que bem rente ao chão a breve certeza de que endureci , revesti com papel negro de seda  as batidas do meu  triste sertanejo coração. Paralisada diante do meu criado muro, esmurro o mundo que criei e mudo.Mudez que trava minhas pernas e faz voar meu sonho de paz cravando um grito de guerra.

09/06/2012

Desenlouqueço

Afoguei-me dentro e fora de mim. Descompasso de tudo. Engolido o cansaço, ameaço, sonho e desisto também de mim... me olho, não vejo nada... espero o tempo, o vento...fracasso em meus planos quais? Não há, nenhum, nem sequer de perto... viver apenas um cumprir horário, trânsito, poluição, aborrecimentos, enfrentamentos...coragem...um sem sentido de coisas não sentidas, mal cedidas, embaçadas...roupas no varal a vida num cabedal um fluir sem vontade, caminhar sem estrada ao encontro do acaso que me leve de novo ao nada. Aqui novamente eu tentando encontrar a passagem secreta de mim mesma para espreitar o que há entorno desta pessoa que se diz eu...que ergue, destrói, desconstrói palavras, imagens e pula no escuro secreto de cores e dores assim para outrem, tornando-se um ente enfadonho, para si um com semente no cúmulo da sua não- mente. sobe nas teias com meias e artimanhas feitas de  vontades dementes, de material de sonho feito... , do que são feitos os sonhos? Caixa de caber impressões incertas no real das horas giradas, ora ensolaradas ora enxovalhadas  e enchuvaradas num per si de não sei que de tanto sentir o anoitecer que de tanto cansaço parece que vou desenlouquecer.
    Tenho ingerido vitaminas como quem num susto engole  o cansaço e pra não perder de vista  o encanto, canto, enquanto a fome me faz sentir o cheiro de um bolo faltando um pedaço. Ando pelas ruas da cidade quando possível como que fosse um refugiado e como doce com as mãos sujas de laços dados com os minutos montada no salto do meu sapato. Penso em comprar o vento, um pouco de vaidade, quem sabe um quilo de alfazema e nada de ansiedade, no impeto de chegar logo me dou  com  o medo do atraso e do mau tempo bem olhado e mal passado, assim deixo o compromisso escorrer bem do meu lado e traço um verdadeiro atestado.

Chuva

Chove sem parar, choro no fio da meada, geada, quase nevada, girassóis na chuva não giram, choram...feriado nacional, sexo e tal, sopas com pimental e sal... filhos com lazy down... ôchi! arroz integral, trigo em grão, granola, meia, pijama, crocs e manteiga no pão! música no chão, amor no fogão... a cabeça girando no sol de chuva com choro de sono... a ortografia insana sem os acentos que clamam! assim como posso eu com a minha língua portuguesa versar o incerto e o deserto, o ermo e o que pletora dentro e fora sem titubear... estudar,  fazer nada, balear  o tempo, o riso, o rio, a brisa  e a chuva que não cessa que não tem pressa que me acessa o  botão da siesta... tanto tempo sem escrever o que de mim amanhece e tece  a bela messe... os passarinhos que me amanheciam tiraram folga nesse dia de água e utopia sem aviso nem poesia, com Demônios da Garoa, Arnaldo Antunes e cia, Vanessinha da Mata quase me mata com um tiro no meu alvo moreno, quase desbotado, ausente de raios ultraviolentos de sol daqui debaixo do equador, arri égua que dor! no meu ai! ab do meu homem! quanta asneira num tempo sem eira nem beira ,sem patativa nem Simone Beauvoirzinha, sem minha avozinha, com seu giral de panelas de barro, sem meu sertão dourado entrando pela janela...  com minha filha adolescente a conter seus segredos e  contar as linhas dos  meus dedos as letras a pularem nas pontas afiadas dos mesmos cabelos.  Dedos congelados de sorvete, ervilha e lentilha no ralo da pia, parede, louça gritando feito obra de Munch e ninguém a arriscar calar o desespero das xícaras, panelas, copos, mulheres e talheres! Escurece em meu chover de tanto viver. Nos verdes  campos de josé são, manhãs, madrugadas, outonos e primaveras a entardecer feito tempestade fechando o verão,sem promessa , nem caminho, nada sozinho,nem um raio de solzinho.Num ato de solidão escrever alivia umas das cordas do meu coração.